Africanos em Portugal

     
   
Anterior

.

 Africanos em Portugal: De Imigrantes a grupos étnicos
( II )

Oito países do mundo, seis dos quais africanos, têm em comum uma mesma língua oficial, o português. Eles testemunham uma história em comum, feita de encontros e  desencontros de culturas e povos. 

.

Para centenas de milhares de imigrantes oriundos das antigas colónias, em particular as de África, era suposto que esta história em comum proporcionasse um melhor acolhimento do que aquele que encontraram. 

.

Identificação

A maioria dos jovens negros não se identifica com os portugueses, apesar de a sua maioria já ter nascido em Portugal (26%) ou viver em Portugal há mais de 10 anos (25%). Esta foi uma das conclusões de um estudo realizado pelo ISCTE, a pedido da Secretaria de Estado da Juventude (Maio 2002). Apenas 4% se revê na sociedade portuguesa branca. 

 

Imagem Pública

A imagem do africano continua a ser associada ao trabalhador da construção civil e a profissões pouco qualificadas, embora no desporto e na música tenham adquirido uma grande projecção.

Desde Eusébio (anos 60), um número crescente de desportistas portugueses de renome internacional são africanos ou de ascendência africana. 

 

Guetos

Os africanos que se estabeleceram em Portugal antes da independência das colónias (1974-75), não tiveram grandes problemas de integração, embora as condições de alojamento não tenham sido as melhores. Os problemas colocaram-se logo a seguir à descolonização, quando vagas continuas de refugiados e imigrantes africanos começaram a chegar. A maioria destes imigrantes eram ilegais e não tardaram em fixar-se em barracas em Lisboa ou nas suas periferias, dada a facilidade como se podia construir uma barraca em qualquer lugar. 

As câmaras municipais, nos anos 80, mostraram-se sempre indiferentes perante o rápido crescimento destes bairros de barracas de imigrantes. A situação nestes bairros degradados foi-se tornando incontrolável, em grande por culpa das autarquias locais. 

Alguns bairros de africanos, sobretudo à volta de Lisboa, acabaram por se tornarem tristemente célebres pelas piores das razões: pobreza, tráfico de droga, violência, etc. O crime organizado não tardou em emergir.

O concelho da Amadora está repleto de bairros problemáticos: Bairro 6 de Maio (Damaia) ; Estrela de África (Venda Nova); Estrada Militar do Alto da Damaia; Alto da Cova da Moura; Quinta da Lage; Serra da Mira; Boba; Bairro de Santa Filomena; Reboleira; Portas de Benfica, Azinhaga dos Besouros, etc. Alguns destes bairros foram tomados por bandos de criminosos, a polícia é frequentemente recebida a tiro. A pequena e a grande criminalidade ultrapassaram aqui todos os limites. Recorde-se que a câmara local sempre se caracterizou por seguir uma política populista, mostrando-se indiferente perante o caos urbanístico que estava a ser instalado no concelho.

Nos concelhos de Loures e Odivelas a situação é igualmente preocupante. Apesar dos alertas prossegue neste concelho a construção de novos bairros de barracas, nomeadamente ao longo de toda a encosta do vale de Odivelas/Loures. Uma política populista prosseguida por estas câmaras municipais, transformou estes concelhos num dos maiores focos de criminalidade dos arredores de Lisboa. Abundam nestes concelhos situações absolutamente inconcebíveis, como o Bairro da Serra (Prior Velho), maioritariamente ocupado por imigrantes da Guiné-Bissau. Alguns casos gritantes foram já "resolvidos" como o do Bairro da Quinta do Mocho, mesmo à entrada de Lisboa.   

O concelho de Cascais, apesar dos realojamentos, continua a ser pontuado por bairros clandestinos como os das Marianas (Carcavelos), Fim do Mundo (Cascais) e outros. O  realojamento das populações destes bairros degradados, não tem alterado substancialmente a delinquência e criminalidade, apenas as transferiu das barracas para os bairros sociais. Alguns deles transformaram-se em verdadeiros focos de violência, como o Bairro da Cruz Vermelha ou o Bairro da Torre. Em Alcoitão, um bairro social ficou conhecido por "Bairro de Hollywood", tal é a dimensão dos confrontos que aí se verificam entre polícias e marginais.

No concelho de Sintra, no meio de um caos urbanístico, proliferam igualmente os bairros clandestinos e degradados como Moinho das Rolas, Cruz Vermelha, Navegadores, ou em termos globais toda a área de Algueirão- Mem Martins. Depois da Amadora este será provavelmente o próxima concelho onde a violência urbana irá atingir enormes proporções. 

Na margem sul do Tejo, proliferam bairros explosivos, como o Pica-Pau Amarelo (Monte da Caparica, Almada), Arrentela, Zona de Miratejo (Seixal), Vale da Amoreira (Moita), Quinta da Mina (Barreiro), Bairro do Afonsoeiro (Montijo) ou o Bairro da Bela Vista (Setúbal). 

O processo de realojamento, encontra-se consideravelmente atrasado em concelhos como os da Amadora, Loures e Odivelas, onde a violência atinge proporções alarmantes. Nestes concelhos não páram de se construírem novas barracas, perante a indiferença das câmaras municipais. 

No Algarve (sul do Portugal), entre Faro e Portimão proliferam também pequenos bairros de africanos, alguns dos quais tristemente conhecidos pelo tráfico de droga e a criminalidade.

A política de realojamento das comunidades africanas, tem-se revelado um completo desastre, ao concentrá-las nos mesmos os bairros sociais, contribuindo para a sua marginalização social. Uma situação idêntica à que se verifica com as comunidades ciganas.

Bairros ou Guetos ?

..

Ascensão Social

Apesar de uma tão longa história em comum, continuam a ser raros os africanos que ascendem a posições de destaque na sociedade portuguesa. Trata-se de uma constatação que ultimamente tem sido objecto de diversos trabalhos na comunicação social portuguesa.

.

Insucesso Escolar

Os resultados escolares dos africanos são em geral inferiores aos dos portugueses nas mesmas escolas. Todos os estudos são unanimes neste ponto. A situação nada tem de anormal, é comum em todos os países do mundo quando se comparam os resultados escolares das crianças nacionais com as dos filhos de imigrantes. Estes últimos são mais penalizados no aproveitamento escolar, devido aos obstáculos decorrentes da sua precária integração social e cultural. No caso das crianças de origem africana, os maus resultados escolares parecem ser ainda mais agravados, não apenas devido a maiores dificuldades de integração social e cultural, famílias pouco estruturadas, problemas no domínio da língua, mas também a eventuais preconceitos racistas. Situações que carecem de um acompanhamento específico.

.

  Famílias Destruídas

Uma das causas de muitos dos problemas sociais jovens africanos está na ausência de uma verdadeira família. Milhares de crianças e jovens são abandonadas pelos pais, tornando-se dessa forma presas fáceis de grupos de marginais que operam nos bairros degradados de Lisboa e arredores.   

.

 
  Discriminação

A maioria dos jovens africanos (80%), segundo o já citado estudo de 2002, considera-se discriminada no acesso ao consumo,  mas sobretudo na forma como são tratados nos estabelecimentos de saúde, nas escolas, tribunais, etc. Formas de tratamento como "preto", "negro" ou "raça negra" são  por estes percepcionados como manifestações de um estigma social.

 

 
  Contestação e Delinquência

Ao contrário das primeiras gerações de africanos, muito marcadas pela passividade, as novas gerações já nascidas em Portugal, procuram diversas formas da sua afirmação cultural, nomeadamente através da música, grafittis, etc.  

No final dos anos 90, começou a desenvolver-se um tipo de cultura marcada contestação violenta da sociedade, acabando por degenerar no vandalismo e no crime. Tornou-se então  frequente verem-se grupos de jovens africanos envolvidos situações de criminalidade organizada: vandalismo de edifícios e equipamentos públicos, destruição de estações de comboios, de metro, tráfico de droga, assaltos a pessoas e bens, no quais tem resultado brutais agressões colectivas e a morte de várias pessoas, incluindo de polícias.

.

Imagens como esta chocaram Portugal.JN.11/6/2005. Segundo a Polícia de Segurança Pública (PSP), cerca de 500 delinquentes assaltaram milhares de pessoas na praia de Carcavelos (Cascais). Numa louca correria pela praia lançaram o pânico, roubaram e agrediram todos os que se atravessavam no caminho, fossem adultos ou crianças. A primeira pessoa a ser roubada e agredido terá sido um imigrante ucraniano. 

.

No dia de Portugal (10 de Junho), em 2005, segundo a PSP e a Comunicação Social portuguesa, a actuação destes bandos de delinquentes teria atingido proporções inimagináveis: um grupo com cerca de 500 indivíduos, oriundos do Concelho da Amadora, assaltou milhares de pessoas numa praia junto a Lisboa (Carcavelos), roubando e agredindo todos aqueles que aí se encontravam. No dia seguinte, noutra praia do sul do país (Quarteira, Algarve), outro grupo mais pequeno (50), também oriundo da Amadora (Cova da Moura) tentou sem grande sucesso praticar um assalto colectivo aos banhistas, usando o mesmo método, conhecido no Brasil por "arrastão".  Um mês depois destes graves acontecimentos que tiveram cobertura mundial, a polícia procurou minimizar os factos, afirmando que apenas 30 ou 40 jovens terão estado envolvidos de forma espontânea e não organizada no "arrastão". (consultar) .

Uma coisa ficou clara: as causas destes gravíssimas problemas sociais devem ser compreendidas e estudadas, mas não se pode ficar por aqui. É preciso que estes actos criminosos sejam combatidos com firmeza, caso contrário acabam por estimular o crescimento de sentimentos xenófobos e racistas contra a população de raça negra. Uma situação igualmente intolerável e que deve ser combatida sem contemplações.  

.

 
  Criminalidade

Alguns discursos racistas continuam a associar a população negra e os ciganos com a criminalidade. Os dados estatísticos da população prisional estão longe de permitir de sustentar qualquer conclusão neste domínio. No caso dos africanos, tudo concorre para a emergência de focos de criminalidade nestas comunidades: habitação em bairros que são verdadeiros guetos, famílias desestruturadas, ausência de apoios sociais e educativos adequados, desenraizamento cultural, dificuldades de acesso à cidadania portuguesa, etc. Face a este panorama não admira que à semelhança do que acontece, por exemplo nos EUA, a percentagem de negros nas prisões seja superior à sua proporção na população.  

..

 
Carlos Fontes

Continuação

Em Foco | Portugal | Europa | Mundo | Histórias | Memórias | Contactos

Para nos contactar:


Imigrantes Somos Todos !
Director: Carlos Fontes