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   A Estratégia 
	da UE-EUA face à Rússia 
	O atual conflito da UE com a Rússia, 
	numa perspectiva histórica, nada tem de novo. É simplesmente a continuidade 
	de um objectivo que desde o século XVIII é regularmente prosseguido por 
	várias potências europeias: 
	enfraquecer ou mesmo aniquilar a grande potência que se criou no leste da 
	Europa. 
	1. Expansão 
	Quando a Ocidente da Europa Portugal, 
	no século XV, iniciava a sua expansão marítima por todo o planeta, no 
	Leste do continente, a Rússia, com uma forte centralização política, 
	criava  as condições indispensáveis para a sua expansão territorial.  
	Os mongóis foram entre o século 
	XIII e o final do século XV, os grandes inimigos dos russos. Apesar de 
	derrotados na 
	
	Batalha de
	
	
	Kulikovo (1380), 
	continuaram a impor o seu domínio sobre os principados russos.
	 Foi só em 1480 que sob 
	a liderança de Ivan III, o Grande acabaram com o domínio dos mongóis.  
	Ivan IV, o Terrível, o primeiro Czar,  
	começou a expansão territorial absorvendo o território dos 
	mongóis, um processo que irá terminar nos confins da China. Em 
	1717 a Rússia e a China concluíam o 
	Tratado de Khyakta em que delimitaram as suas 
	fonteiras incluindo as da Mongólia. Esta expansão pela Asia deu à Rússia recursos materiais e 
	humanos para se afirmar como uma temível potência capaz de dominar múltiplos povos. 
	A expansão da Rússia para 
	Ocidente no século XVII abriu novas frentes de guerra, agora com os suecos,
	polacos e lituanos, mas que se traduziu na anexação de 
	novos territórios.  
	A construção da cidade de 
	São Petersburgo (Sampetersburgo), em 1703, por Pedro, O Grande, foi o coroar desta 
	afirmação no espaço europeu. A cidade foi a capital da Rússia entre 
	1712 e 1918. 
	Devido à dimensão do seu território desde  o século XVIII 
	passou a ser 
	assumida como uma das grandes potencias a nível mundial, quando finalmente 
	conseguiu derrotar o turcos, conquistando novos territórios e o 
	desejado acesso ao Mar 
	Negro (1768 -1774).  
	2. Primeiras Ofensivas 
	A Rússia prosseguiu ao longo de todo o 
	século XIX a sua expansão territorial que a levará a criar um império que se 
	estendia desde a Finlândia ao Alasca, território que irá 
	vender aos EUA em 1867. 
	
	  
	 No 
	centro de Moscovo, no local onde em 1812 foi decida a estratégia que a 
	Rússia devia seguir para derrotar os franceses, está agora o Museu Panorama 
	Borodino, dentro do se encontra a pintura "A Batalha de Borodino" (1912), 
	obra de Franz Roubaud, com 115 metros de comprimento e 15 de altura. 
	
	
	Face ao crescente poder da Rússia, os franceses liderados por 
	Napoleão, em 1812, julgam ter a força suficiente para aniquilar o novo império, mas 
	acabam destroçados. A Rússia com a Inglaterra passam a ser consideradas 
	as duas maiores 
	potências mundiais.  
	
	  
	
	Centro comercial "GUM", 
	edificado no final do século XIX, na Praça Vermelha em Moscovo.  
	
	Os
	ingleses ao longo do séculos XIX irão desenvolver uma estratégia de 
	guerra que procurou conter o expansionismo russo que estava a ameaçar a sua 
	própria expansão na Ásia, nomeadamente na India.  
	
	
	A mortífera Guerra da Crimeia (1853/6), que envolveu um aliança entre
	turcos, ingleses, franceses, Italianos (reino da 
	Sardenha) e austríacos procurou conter a expansão russa nos Balcãs e 
	o seu acesso ao Mar Mediterrâneo. 
	
	No inicio XX, os japoneses
	enfrentam o expansionismo russo, ambos pretendiam conquistar 
	
	a Coreia e a Manchúria (uma vasta região do leste da Ásia que atualmente 
	inclui o nordeste da China).Os 
	russos sofrem uma pesada derrota no Mar do Japão (1905) que abala o poder 
	dos Czares. As profundas desigualdades no império Russo acabam por conduzir 
	a profundas mudanças políticas internas com repercussões mundiais. 
	
	  
	
	  
	
	Cruzador Aurora no porto de 
	Sampetersburgo (antiga Leninegrado). O tiro que deu inicio à Revolução de 
	Outubro de 1917 foi disparado deste navio.   
	
	
	A Revolução Russa, em 1917, que levou ao poder os comunistas que 
	impõem no império um modelo novo regime político-económico 
	(comunismo) que irá ser replicado noutros países: China (1949), Coreia do 
	Norte, Cuba (1959),  Vietname, etc. O poder da Rússia é agora também 
	ideológico, difundido à escala global pelos movimentos comunistas. 
	Os alemães liderados por 
	Hitler em Junho de 1941 invadem a Rússia, cercam São Petersburgo,  
	ocupam parte da Ucrânia e avançam para a conquista de Moscovo. Julgam 
	que num mês tem a Rússia dominada. Enganam-se e a guerra prossegue, acabando derrotados (1945). 
	Mais 
	A repartição da Europa que se seguiu à 
	II Guerra Mundial, em 1949, permite que a Rússia liderada pelos comunistas, 
	forme na Europa um vasto bloco de países sob o seu domínio direto ou 
	indireto, o chamado bloco soviético. Mais de metade do mundo passou também a 
	estar  sob a influência da Rússia, o que lhe deu um poder imenso. 
	
	  
	
	Após a II Guerra Mundial, 
	Estaline mandou, em 1947, erguer em Moscovo sete edificios de grandes dimensões 
	para comemorar a fundação da cidade e o poder do novo regime saído da Revolução de 1917. Hoje 
	estão ocupados pela Universidade de Moscovo (na foto), o ministério dos 
	negócios estrangeiros, um hotel, blocos de apartamentos, serviços, etc. 
  
	3. A Nova Ofensiva 
	 
	A Rússia nos anos 50 e 60 tem uma influência determinante nos acontecimentos políticos e 
	militares a nível mundial, contribuindo para o fim das colónias das potências 
	europeias em África e na Ásia, mas também para a instauração de regimes 
	políticos de economia estatizada. A sobrevivência do império russo passava 
	naturalmente por enfraquecer os seus inimigos externos (regimes 
	capitalistas). 
	Nos vários países europeus que depois 
	da II Guerra Mundial ficaram submetidos ao 
	controlo Russo, a partir de finais dos anos 60 revelam crescentes sinais de 
	descontentamento com o modo de vida e a cultura 
	"soviética" que lhes é imposto.  
	
	  
	
	Defesa de Sebastopal (1942), de 
	Alexander Deineka (1899-1969), Museu de Arte Russa, em Moscovo. 
	
	 A pujante arte russa do 
	período da Revolução de 1917 deu lugar a ao "realismo socialista", que não 
	tardou em repetição de formulas.   
	A principal ameaça do Império Russo 
	estava na crescente atração dos seus habitantes pelo estilo de vida 
	dos que viviam nos regimes capitalistas (liberdades, democracia, consumos, 
	artes, etc). A arte russa, por exemplo, estava estagnada pelos modelos 
	artísticos impostos pelo regime. 
	A revolta em Praga (1968) e na Polónia 
	(1980) mostram que o império russo, liderado pelos comunistas estava 
	ameaçado.  
	
	 
	
	3.1. A Grande Oportunidade 
	A economia russa virada para a criação e manutenção um vasto aparelho militar 
	e repressivo capaz de controlar um vasto império, entra 
	em decadência. Em 1980 deixa de ser a 2ª. economia mundial quando é 
	ultrapassada pelo Japão.  A guerra no Afeganistão (1979-1989) 
	contribuiu para debilitar ainda mais a economia russa. 
	Em 1986, quando Portugal e a Espanha 
	aderem à CEE (atual UE), Mikhail Gorbatchov (gov.1985-1991), o novo líder da 
	Rússia, empreende uma série de reformas, a chamada Perestroika, tendo 
	em vista libertar a economia dos custos que representavam a manutenção do 
	seu vasto império. 
	A Perestroika acabou por 
	ser para a UE e os EUA a grande oportunidade histórica para 
	desagregar a Rússia, através do apoio aos movimentos separatistas dos estados do bloco soviético. 
	Os regimes ocidentais surgem como o modelo político-económico a seguir. 
  
	3.2. Desagregação do Bloco Soviético 
	
	A sucessão de acontecimentos é 
	vertiginosa: 
	  
	- Fim da Republica Democrática da Alemanha (1989). 
	Unificação da Alemanha. 
	
	- Libertação da Polónia, Bulgária, Roménia, Hungria, Estónia, Letónia, 
	Lituânia. 
	
	- Desagregação da Checoslováquia dando origem à República Checa e à 
	Eslováquia. 
	- Desagregação da Jugoslávia, em 1991, 
	seguida de várias guerras civis e a criação de novos estados: 
	Sérvia, Croácia, Eslovénia, Montenegro, Macedónia, Kosovo, Bósnia e 
	Herzegovina. 
	 
	3.3. Desagregação da URSS 
	Em 1991 a URSS desagrega-se, dando 
	origem à Comunidade dos Estados Independentes (CEI), constituída 
	inicialmente por 11 repúblicas que pertenciam à antiga União Soviética 
	(Armênia, Azerbaijão, Bielorrússia, Cazaquistão, Quirguistão, Moldávia, 
	Rússia, Tajiquistão, Turcomenistão, Ucrânia, Uzbequistão) 
	 
	A) Azerbeijão, Turcomenistão (afastou-se da CEI em 2005), Uzbequistão, 
	Casaquistão, Quirguistão e Tajiquistão, estados muçulmanos. 
	 
	- B) Bielorrussia, Georgia, Moldavia e Ucrania foram assumidas casos 
	dramáticos, pois eram à seculos assumidas como parte da Rússia 
	 
	- . A independência da Bielorrussia, em 1991, não levantou grandes problemas 
	porque a mesmo passou a fazer parte da CEI (2000). 
	 
	- A independência da Geórgia (anexada no século XIX), em 1991, foi seguida 
	de uma guerra civil. Ficou sem uma parte do seu 
	território, a Abecássia e a Ossétia do Sul que se ligou à Russia. 
	 
	- A independência da Moldávia foi seguida de uma guerra civil e da divisão do país, 
	entre o lado ocidental e o pró-russo. 
	 
	- A independência da Ucrânia, a mais dramática de todas, foi seguida de uma 
	guerra civil entre pró-UE e pró-Russia. A consequência foi a divisão 
	da Ucrânia. 
	 
	
	4. Posição da UE 
	 
	A politica da UE é face à Rússia é definida globalmente pelos 
	EUA, tendo em conta os interesses específicos da Alemanha e dos estados 
	vizinhos da Rússia, como a Polónia, Finlândia, etc. 
	Todos  manifestam  historicamente um interesse comum: uma Rússia fraca e dividida internamente. 
	 
	Face à crise interna da Rússia como agiu a UE? 
	 
	- Estimulou os movimentos de separação do bloco soviético e integrou 
	rapidamente muitos países: Roménia, Bulgária, Polónia, Hungria, Estónia, 
	Letónia, Lituânia. 
	 
	- Fomentou a desagregação da Jugoslávia  mergulhando-a em guerras civis, 
	e  integrando depois os estados dela 
	resultantes: Croácia, Eslovénia, etc. Os que 
	ainda não foram integrados, estão em negociações para a sua adesão.  
	- Os países resultantes da 
	Checoslováquia -a Republica Checa e a Eslováquia - foram rapidamente 
	absorvidos na UE. 
	Tratou-se, nestes casos, de segurar 
	politicamente estes estados fora do controlo da Rússia. 
	 
	- Fomentou o separatismo na Geórgia e na Moldávia, prometendo-lhes a sua 
	integração na UE.  
	A Ucrânia, neste panorama, era a situação mais 
	complexa devido à importância económica deste país para a Rússia. A UE de forma ativa apoiou 
	a criação de movimentos pró-UE contra a Rússia, o que acabou por conduzir a 
	Ucrânia à guerra civil. A Crimeia separou-se da Ucrânia e integrou-se 
	na Rússia. A parte leste da Ucrânia - Donetsk e Lugansk - está em guerra 
	desde 2014 para se ligar à Rússia.  
	 
 5. Papel da Nato 
	Para apoiar esta estratégia de desagregação da 
	Rússia, os EUA e os seus aliados na UE, através da Nato instalaram junto às 
	fronteiras da Rússia um vasto sistema militar, cuja dimensão não para de 
	aumentar. Montaram igualmente um enorme aparelho de contra-informação e de 
	propaganda contra a Rússia.  Paralelamente procuram sob 
	diversas formas debilitar o país através de sanções económicas, e 
	encontrarem alternativas para as importações russas, 
	como o petróleo e o gás. 
	  
	6. A nova Rússia A nova 
	Rússia, resultante da Perestroika remeteu, sem complexos, o "comunismo" para 
	a história. 
	 O seu passado imperial 
	anterior a 1917 foi reabilitado em todas as suas dimensões, nomeadamente 
	na exaltação dos seus feitos. Os símbolos dos do Czares são dos 
	símbolos da Rússia pós-Perestroika. 
	   
	Complexo religioso do Mosteiro 
	da Trindade-São Sérgio (ou Lavra da Trindade e São Sérgio), fundado m 1345, 
	é o mais imponente de toda a Rússia. São Sérgio é o padroeiro da Rússia 
	desde 1422. A religião ortodoxa voltou a 
	ocupar um lugar destacado na vida Rússia, vendo-se por todo o lado os seus 
	templos a serem reabilitados e abertos. A reconciliação com o passado é 
	total.   
	
	Detentora de vastos recursos naturais, a economia russa continua a assentar 
	na sua exportação:   
	É o maior produtor mundial de petróleo 
	e o segundo maior exportador, depois da OPEC. 
	É o maior produtor e exportador de gás 
	natural. 
	Possui a oitava maior reserva mundial de
	carvão e é o segundo maior exportador. 
	O fundos obtidos com estas exportações 
	tem sido usados para recuperar as suas infraestruturas profundamente debilitadas 
	nas últimas décadas do "comunismo", mas também para melhorar as 
	condições de vida da população.  
	A abertura ao "capitalismo" 
	(privatizações) possibilitada pela Perestroika, entre 1991 e 1999, conduziu 
	a Rússia a um verdadeiro colapso económico. Esta situação que só foi 
	revertida  a partir de 2000, quando o Estado voltou a controlar a exportação dos 
	principais recursos naturais do país. 
	 
	Esta abertura permitiu, todavia, difundir as novas tecnologias na 
	Rússia, atualizar todo o sistema produtivo segundo os modelos mais 
	avançados do mundo. 
	  
	  
	O culto da personalidade é 
	próprio do grandes impérios, onde é enorme a distância entre o poder 
	político e os cidadãos. Na Rússia atual tudo se vende e mistura: imagens dos 
	antigos Czares, Estaline ou Putin. A Rússia continua a 
	ter um estado fortemente centralizado, assente no culto de personalidade dos 
	seus lideres. A imprensa está controlada e a "democracia" é mais aparente 
	que real. 
	 A principal ameaça externa da Rússia 
	continua a ser a atração que as liberdades e a democracia que gozam as 
	populações dos regimes ocidentais, o que conduz a crescentes 
	descontentamentos e a surgimento de movimentos independentistas sobretudo 
	nas regiões periféricas. Nesse sentido, a imprensa Russa tem que 
	continuar a mostrar uma imagem terrível de tudo o que se passas na EU, e a 
	procurar por todos os meios que a mesma também se desagregue. 
	 O 
	descontentamento na UE é vital para a sua sobrevivência, por isso apoia os 
	movimentos políticos de esquerda ou de direita que apelam à desagregação da 
	UE. 
	
	Em países como a 
	
	Bulgária,
	
	
	Hungria, 
	Grécia, Chipre ou a Sérvia parecem ser sensíveis a estas 
	orientações pró-russas. 
	Em alguns estado membros da UE, a Rússia poderá fomentar movimentos de cisão 
	dado possuir nos mesmos importantes minorias étnicas: 
	
	25,6% dos 1,3 milhões habitantes da 
	
	Estónia 
	e 27,8% dos 2,2 milhões de habitantes da 
	
	Letônia 
	são etnicamente russos. 
	 
	  
	A nova e imponente mesquita de 
	Moscovo. A Rússia atual, 
	com uma área de 17.075.400 quilómetros quadrados, continua a ser uma 
	grande potência mundial,  com os seus 146 milhões de habitantes, 
	
	mais de 100 povos diferentes, 26 milhões de 
	muçulmanos, cuja integração social é um sério problema. Até quando se 
	manterá a unidade deste vasto império ? Carlos Fontes  |