Carlos Fontes

 

 

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Arte Russa

(século XX)

 

Literatura e Música

 

A Estratégia da UE-EUA face à Rússia

O atual conflito da UE com a Rússia, numa perspectiva histórica, nada tem de novo. É simplesmente a continuidade de um objectivo que desde o século XVIII é regularmente prosseguido por várias potências europeias: enfraquecer ou mesmo aniquilar a grande potência que se criou no leste da Europa.

1. Expansão

Quando a Ocidente da Europa Portugal, no século XV, iniciava a sua expansão marítima por todo o planeta, no Leste do continente, a Rússia, com uma forte centralização política, criava  as condições indispensáveis para a sua expansão territorial.

Os mongóis foram entre o século XIII e o final do século XV, os grandes inimigos dos russos. Apesar de derrotados na Batalha de Kulikovo (1380), continuaram a impor o seu domínio sobre os principados russos.  Foi só em 1480 que sob a liderança de Ivan III, o Grande acabaram com o domínio dos mongóis.

Ivan IV, o Terrível, o primeiro Czar,  começou a expansão territorial absorvendo o território dos mongóis, um processo que irá terminar nos confins da China. Em 1717 a Rússia e a China concluíam o Tratado de Khyakta em que delimitaram as suas fonteiras incluindo as da Mongólia. Esta expansão pela Asia deu à Rússia recursos materiais e humanos para se afirmar como uma temível potência capaz de dominar múltiplos povos.

A expansão da Rússia para Ocidente no século XVII abriu novas frentes de guerra, agora com os suecos, polacos e lituanos, mas que se traduziu na anexação de novos territórios.

A construção da cidade de São Petersburgo (Sampetersburgo), em 1703, por Pedro, O Grande, foi o coroar desta afirmação no espaço europeu. A cidade foi a capital da Rússia entre 1712 e 1918.

Devido à dimensão do seu território desde  o século XVIII passou a ser assumida como uma das grandes potencias a nível mundial, quando finalmente conseguiu derrotar o turcos, conquistando novos territórios e o desejado acesso ao Mar Negro (1768 -1774).

2. Primeiras Ofensivas

A Rússia prosseguiu ao longo de todo o século XIX a sua expansão territorial que a levará a criar um império que se estendia desde a Finlândia ao Alasca, território que irá vender aos EUA em 1867.

 No centro de Moscovo, no local onde em 1812 foi decida a estratégia que a Rússia devia seguir para derrotar os franceses, está agora o Museu Panorama Borodino, dentro do se encontra a pintura "A Batalha de Borodino" (1912), obra de Franz Roubaud, com 115 metros de comprimento e 15 de altura.

Face ao crescente poder da Rússia, os franceses liderados por Napoleão, em 1812, julgam ter a força suficiente para aniquilar o novo império, mas acabam destroçados. A Rússia com a Inglaterra passam a ser consideradas as duas maiores potências mundiais.

Centro comercial "GUM", edificado no final do século XIX, na Praça Vermelha em Moscovo.

Os ingleses ao longo do séculos XIX irão desenvolver uma estratégia de guerra que procurou conter o expansionismo russo que estava a ameaçar a sua própria expansão na Ásia, nomeadamente na India.

A mortífera Guerra da Crimeia (1853/6), que envolveu um aliança entre turcos, ingleses, franceses, Italianos (reino da Sardenha) e austríacos procurou conter a expansão russa nos Balcãs e o seu acesso ao Mar Mediterrâneo.

No inicio XX, os japoneses enfrentam o expansionismo russo, ambos pretendiam conquistar a Coreia e a Manchúria (uma vasta região do leste da Ásia que atualmente inclui o nordeste da China).Os russos sofrem uma pesada derrota no Mar do Japão (1905) que abala o poder dos Czares. As profundas desigualdades no império Russo acabam por conduzir a profundas mudanças políticas internas com repercussões mundiais.

 

Cruzador Aurora no porto de Sampetersburgo (antiga Leninegrado). O tiro que deu inicio à Revolução de Outubro de 1917 foi disparado deste navio. 

A Revolução Russa, em 1917, que levou ao poder os comunistas que impõem no império um modelo novo regime político-económico (comunismo) que irá ser replicado noutros países: China (1949), Coreia do Norte, Cuba (1959),  Vietname, etc. O poder da Rússia é agora também ideológico, difundido à escala global pelos movimentos comunistas.

Os alemães liderados por Hitler em Junho de 1941 invadem a Rússia, cercam São Petersburgo,  ocupam parte da Ucrânia e avançam para a conquista de Moscovo. Julgam que num mês tem a Rússia dominada. Enganam-se e a guerra prossegue, acabando derrotados (1945). Mais

A repartição da Europa que se seguiu à II Guerra Mundial, em 1949, permite que a Rússia liderada pelos comunistas, forme na Europa um vasto bloco de países sob o seu domínio direto ou indireto, o chamado bloco soviético. Mais de metade do mundo passou também a estar  sob a influência da Rússia, o que lhe deu um poder imenso.

Após a II Guerra Mundial, Estaline mandou, em 1947, erguer em Moscovo sete edificios de grandes dimensões para comemorar a fundação da cidade e o poder do novo regime saído da Revolução de 1917. Hoje estão ocupados pela Universidade de Moscovo (na foto), o ministério dos negócios estrangeiros, um hotel, blocos de apartamentos, serviços, etc.
 

3. A Nova Ofensiva

A Rússia nos anos 50 e 60 tem uma influência determinante nos acontecimentos políticos e militares a nível mundial, contribuindo para o fim das colónias das potências europeias em África e na Ásia, mas também para a instauração de regimes políticos de economia estatizada. A sobrevivência do império russo passava naturalmente por enfraquecer os seus inimigos externos (regimes capitalistas).

Nos vários países europeus que depois da II Guerra Mundial ficaram submetidos ao controlo Russo, a partir de finais dos anos 60 revelam crescentes sinais de descontentamento com o modo de vida e a cultura "soviética" que lhes é imposto.

Defesa de Sebastopal (1942), de Alexander Deineka (1899-1969), Museu de Arte Russa, em Moscovo.

 A pujante arte russa do período da Revolução de 1917 deu lugar a ao "realismo socialista", que não tardou em repetição de formulas. 

A principal ameaça do Império Russo estava na crescente atração dos seus habitantes pelo estilo de vida dos que viviam nos regimes capitalistas (liberdades, democracia, consumos, artes, etc). A arte russa, por exemplo, estava estagnada pelos modelos artísticos impostos pelo regime.

A revolta em Praga (1968) e na Polónia (1980) mostram que o império russo, liderado pelos comunistas estava ameaçado.


3.1. A Grande Oportunidade
A economia russa virada para a criação e manutenção um vasto aparelho militar e repressivo capaz de controlar um vasto império, entra em decadência. Em 1980 deixa de ser a 2ª. economia mundial quando é ultrapassada pelo Japão.  A guerra no Afeganistão (1979-1989) contribuiu para debilitar ainda mais a economia russa.

Em 1986, quando Portugal e a Espanha aderem à CEE (atual UE), Mikhail Gorbatchov (gov.1985-1991), o novo líder da Rússia, empreende uma série de reformas, a chamada Perestroika, tendo em vista libertar a economia dos custos que representavam a manutenção do seu vasto império.

A Perestroika acabou por ser para a UE e os EUA a grande oportunidade histórica para desagregar a Rússia, através do apoio aos movimentos separatistas dos estados do bloco soviético. Os regimes ocidentais surgem como o modelo político-económico a seguir.
 

3.2. Desagregação do Bloco Soviético

A sucessão de acontecimentos é vertiginosa:

 

- Fim da Republica Democrática da Alemanha (1989). Unificação da Alemanha.

- Libertação da Polónia, Bulgária, Roménia, Hungria, Estónia, Letónia, Lituânia.

- Desagregação da Checoslováquia dando origem à República Checa e à Eslováquia.

- Desagregação da Jugoslávia, em 1991, seguida de várias guerras civis e a criação de novos estados: Sérvia, Croácia, Eslovénia, Montenegro, Macedónia, Kosovo, Bósnia e Herzegovina.

3.3. Desagregação da URSS

Em 1991 a URSS desagrega-se, dando origem à Comunidade dos Estados Independentes (CEI), constituída inicialmente por 11 repúblicas que pertenciam à antiga União Soviética (Armênia, Azerbaijão, Bielorrússia, Cazaquistão, Quirguistão, Moldávia, Rússia, Tajiquistão, Turcomenistão, Ucrânia, Uzbequistão)

A) Azerbeijão, Turcomenistão (afastou-se da CEI em 2005), Uzbequistão, Casaquistão, Quirguistão e Tajiquistão, estados muçulmanos
.


- B) Bielorrussia, Georgia, Moldavia e Ucrania foram assumidas casos dramáticos, pois eram à seculos assumidas como parte da Rússia


- . A independência da Bielorrussia, em 1991, não levantou grandes problemas porque a mesmo passou a fazer parte da CEI (2000).


- A independência da Geórgia (anexada no século XIX), em 1991, foi seguida de uma guerra civil. Ficou sem uma parte do seu território, a Abecássia e a Ossétia do Sul que se ligou à Russia.


- A independência da Moldávia foi seguida de uma guerra civil e da divisão do país, entre o lado ocidental e o pró-russo.


- A independência da Ucrânia, a mais dramática de todas, foi seguida de uma guerra civil entre pró-UE e pró-Russia. A consequência foi a divisão da Ucrânia.

4. Posição da UE

A politica da UE é face à Rússia é definida globalmente pelos EUA, tendo em conta os interesses específicos da Alemanha e dos estados vizinhos da Rússia, como a Polónia, Finlândia, etc. Todos  manifestam  historicamente um interesse comum: uma Rússia fraca e dividida internamente.


Face à crise interna da Rússia como agiu a UE?


- Estimulou os movimentos de separação do bloco soviético e integrou rapidamente muitos países: Roménia, Bulgária, Polónia, Hungria, Estónia, Letónia, Lituânia.


- Fomentou a desagregação da Jugoslávia  mergulhando-a em guerras civis, e  integrando depois os estados dela resultantes: Croácia, Eslovénia, etc. Os que ainda não foram integrados, estão em negociações para a sua adesão.

- Os países resultantes da Checoslováquia -a Republica Checa e a Eslováquia - foram rapidamente absorvidos na UE.

Tratou-se, nestes casos, de segurar politicamente estes estados fora do controlo da Rússia.


- Fomentou o separatismo na Geórgia e na Moldávia, prometendo-lhes a sua integração na UE.

A Ucrânia, neste panorama, era a situação mais complexa devido à importância económica deste país para a Rússia. A UE de forma ativa apoiou a criação de movimentos pró-UE contra a Rússia, o que acabou por conduzir a Ucrânia à guerra civil. A Crimeia separou-se da Ucrânia e integrou-se na Rússia. A parte leste da Ucrânia - Donetsk e Lugansk - está em guerra desde 2014 para se ligar à Rússia.


 
5. Papel da Nato

Para apoiar esta estratégia de desagregação da Rússia, os EUA e os seus aliados na UE, através da Nato instalaram junto às fronteiras da Rússia um vasto sistema militar, cuja dimensão não para de aumentar. Montaram igualmente um enorme aparelho de contra-informação e de propaganda contra a Rússia.

 Paralelamente procuram sob diversas formas debilitar o país através de sanções económicas, e encontrarem alternativas para as importações russas, como o petróleo e o gás.

6. A nova Rússia

A nova Rússia, resultante da Perestroika remeteu, sem complexos, o "comunismo" para a história.

O seu passado imperial anterior a 1917 foi reabilitado em todas as suas dimensões, nomeadamente na exaltação dos seus feitos. Os símbolos dos do Czares são dos símbolos da Rússia pós-Perestroika.

 

Complexo religioso do Mosteiro da Trindade-São Sérgio (ou Lavra da Trindade e São Sérgio), fundado m 1345, é o mais imponente de toda a Rússia. São Sérgio é o padroeiro da Rússia desde 1422.

A religião ortodoxa voltou a ocupar um lugar destacado na vida Rússia, vendo-se por todo o lado os seus templos a serem reabilitados e abertos. A reconciliação com o passado é total.

 

Detentora de vastos recursos naturais, a economia russa continua a assentar na sua exportação:

 

É o maior produtor mundial de petróleo e o segundo maior exportador, depois da OPEC.

É o maior produtor e exportador de gás natural.

Possui a oitava maior reserva mundial de carvão e é o segundo maior exportador.

O fundos obtidos com estas exportações tem sido usados para recuperar as suas infraestruturas profundamente debilitadas nas últimas décadas do "comunismo", mas também para melhorar as condições de vida da população.

A abertura ao "capitalismo" (privatizações) possibilitada pela Perestroika, entre 1991 e 1999, conduziu a Rússia a um verdadeiro colapso económico. Esta situação que só foi revertida  a partir de 2000, quando o Estado voltou a controlar a exportação dos principais recursos naturais do país.

Esta abertura permitiu, todavia, difundir as novas tecnologias na Rússia, atualizar todo o sistema produtivo segundo os modelos mais avançados do mundo.

 

O culto da personalidade é próprio do grandes impérios, onde é enorme a distância entre o poder político e os cidadãos. Na Rússia atual tudo se vende e mistura: imagens dos antigos Czares, Estaline ou Putin.

A Rússia continua a ter um estado fortemente centralizado, assente no culto de personalidade dos seus lideres. A imprensa está controlada e a "democracia" é mais aparente que real.

A principal ameaça externa da Rússia continua a ser a atração que as liberdades e a democracia que gozam as populações dos regimes ocidentais, o que conduz a crescentes descontentamentos e a surgimento de movimentos independentistas sobretudo nas regiões periféricas. Nesse sentido, a imprensa Russa tem que continuar a mostrar uma imagem terrível de tudo o que se passas na EU, e a procurar por todos os meios que a mesma também se desagregue.

O descontentamento na UE é vital para a sua sobrevivência, por isso apoia os movimentos políticos de esquerda ou de direita que apelam à desagregação da UE. Em países como a Bulgária, Hungria, Grécia, Chipre ou a Sérvia parecem ser sensíveis a estas orientações pró-russas.

Em alguns estado membros da UE, a Rússia poderá fomentar movimentos de cisão dado possuir nos mesmos importantes minorias étnicas: 25,6% dos 1,3 milhões habitantes da Estónia e 27,8% dos 2,2 milhões de habitantes da Letônia são etnicamente russos.

A nova e imponente mesquita de Moscovo.

A Rússia atual, com uma área de 17.075.400 quilómetros quadrados, continua a ser uma grande potência mundial,  com os seus 146 milhões de habitantes, mais de 100 povos diferentes, 26 milhões de muçulmanos, cuja integração social é um sério problema. Até quando se manterá a unidade deste vasto império ?

Carlos Fontes

 
 

 

Rússia- União Europeia

 

A Rússia na IIª Guerra Mundial (1939-1945)

Império Russo/União Soviética

 

 
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