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Emigrantes Portugueses na Austrália

     
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Portugueses na Austrália

Esta comunidade é constituída actualmente por cerca de 55 339 portugueses, surgiu após a 2ª. Guerra Mundial e revela um enorme dinamismo. 

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De Mendonça ao pastel de nata
Ricardo Veloso, correspondente
do Jornal Expresso na Austrália
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Expresso, 1/06/2002.

A meio mundo de distância de Portugal, a Austrália afigura-se um continente longínquo e exótico que pouco ou nada tem a ver com a realidade portuguesa. Porém, não fosse o Tratado de Tordesilhas, muito provavelmente a Austrália seria agora mais um País de Língua Oficial Portuguesa (PALOP).

Ainda mal Portugal celebrava a descoberta do Brasil, já Cristóvão de Mendonça, em 1522, trazia notícias de um imenso e rico continente a sul de Timor. A astúcia dos portugueses em convencer os espanhóis a mudar para oeste a linha do Tratado de Tordesilhas era agora de uma ironia cruel. O portugueses tinham ganho o Brasil, é certo, mas a grande parte do continente de Mendonça ficava agora para lá do Meridiano de Tordesilhas, fora do alcance de Portugal.

Ainda hoje, a simples análise de um mapa denuncia os vestígios da presença portuguesa na região. A costa noroeste da Austrália revela o nome Abrolhos, que não é mais do que a reminiscência de uma frase portuguesa que ecoa, através dos tempos, os gritos dos marinheiros portugueses ao navegarem por estas águas traiçoeiras: «Abre os olhos!» A própria fronteira terrestre da Austrália Ocidental, feita à boa maneira anglo-saxónica de delinear fronteiras a régua e esquadro, não é mais do que o malfadado meridiano de Tordesilhas.

Quis assim o destino que os portugueses só regressassem a este continente quatro séculos depois da sua descoberta por Cristóvão de Mendonça.

Os pioneiros da imigração portuguesa na Austrália foram os madeirenses que na década de 50 estabeleceram uma pequena comunidade piscatória na cidade de Fremantle, na costa ocidental. Desde então, os portugueses continuaram a chegar à Austrália em número sempre crescente até aos anos 90, altura em que muitos começaram então a regressar a Portugal.

De acordo com o recenseamento de 1996 levado a cabo pelo Australian Bureau of Statistics, a Austrália contava nessa altura com cerca de 17 mil pessoas nascidas em Portugal e mais cerca de nove mil descendentes de portugueses, que em conjunto representavam uns meros 0,15% da população australiana

Apesar de pequena, a comunidade portuguesa encontra-se razoavelmente bem organizada. Em cidades como Perth, Melbourne ou Sydney, é possível encontrar centros culturais e recreativos, restaurantes e até bairros inteiros onde se pode falar exclusivamente a língua de Camões, comer um pastel de bacalhau seguido de uma bica e rematar com um pastel de nata.

Aliás, a gastronomia é a imagem de marca da comunidade portuguesa na Austrália. O nosso humilde frango no churrasco, conhecido nestas paragens como «portuguese piri-piri chicken», tem «arrasado». O tradicional pastel de nata, ou «portuguese custard tart», é hoje servido em muitos restaurantes e cafés de Sydney, e também tem caído no goto dos australianos. Um pouco por todo o lado, os restaurantes portugueses multiplicam-se e as cadeias portuguesas de pronto a comer Nando's e Oporto encontram-se em franca expansão, contando com mais de 60 lojas a nível nacional.

Mas a exuberância gastronómica esconde uma realidade preocupante revelada pelas estatísticas de 1996: 61% da comunidade portuguesa não possui habilitações literárias ou qualificações profissionais de qualquer espécie. Só uma minoria de portugueses, 28%, tem alguma forma de qualificação, contra uma média nacional de 42,3%.

Se, por um lado, a falta de qualificações impede a comunidade portuguesa de ter um papel mais relevante na sociedade australiana, por outro lado é essa mesma falta de qualificações que mantém a comunidade empregada, dada a abundância da oferta de trabalho para mão de obra não qualificada. Os dados de 1996 mostram claramente este paradoxo, com a taxa de desemprego da comunidade portuguesa situada sete pontos percentuais abaixo da média nacional de 9.2%. Regra geral, a mão-de-obra não qualificada é razoavelmente bem paga e a grande maioria dos portugueses consegue manter um nível de vida igual - e por vezes superior - à média australiana.

Mas a comunidade portuguesa conta também com profissionais altamente qualificados, como médicos, advogados e docentes universitários, que muito têm contribuído para a causa lusitana. A sua presença é, no entanto, discreta, e a sua visibilidade dentro e fora da comunidade bastante reduzida. Não só por serem em menor número mas também porque, ao integrarem-se melhor na sociedade australiana, fazem que as suas raízes étnicas deixem de ser perceptíveis.

Quanto à segunda geração da comunidade portuguesa na Austrália, cedeu vítima da distância que a separa de Portugal. Em grande parte alheada das realidades do Portugal contemporâneo, os descendentes dos imigrantes portugueses encontram-se em franco processo de assimilação pela sociedade australiana. Isto está longe de significar o fim da influência lusitana pelas terras de Mendonça. Uma nova vaga de portugueses altamente qualificados está a chegar à Austrália e promete abrir um novo capítulo na história das relações entre os dois países. E há, também, australianos que muito têm feito pela imagem de Portugal. Um deles é Kenneth Gordon McIntyre, de 95 anos e com duas condecorações do Estado português. Enquanto professor de Literatura Inglesa na Universidade de Melbourne, McIntyre apaixonou-se pela obra de Camões, o que o levou a estudar português, como autodidacta. A sua crescente curiosidade pela cultura e história portuguesas culminou, em 1977, com a publicação do livro «The Secret Discovery of Australia». Com uma argumentação impressionante, a obra restitui a Cristóvão de Mendonça o seu devido lugar na história mundial, como o legítimo descobridor da Austrália. Após a publicação, o livro foi utilizado como manual escolar na Austrália, tendo contribuído significativamente para a reabilitação da imagem de Portugal durante os anos da crise diplomática entre Portugal e a Austrália. O livro encontra-se traduzido para português e foi publicado em 1989 pela Fundação Oriente.

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Expresso, 1/06/2002

Luis Geraldes

É português, tem 45 anos e chegou à Austrália em 1985. Artista de profissão, Geraldes representa uma nova geração de imigrantes portugueses na Austrália. Depois de se licenciar pelo IADE, em Lisboa, em 1984, obteve mais dois graus académicos, na Deakin University e na Monash University. Recentemente, terminou o mestrado na Monash University e leccionou também no prestigiado Royal Melbourne Institute of Technology. A juntar ao currículo académico invejável, os seus quadros podem ser admirados em sítios tão diversos como o Japão, Estados Unidos, Israel, Alemanha, Espanha, França e Canadá. Em Portugal, fazem parte das colecções da Caixa Geral de Depósitos e do Ministério da Justiça e Luís Geraldes expõe regularmente na galeria S. Mamede em Lisboa. Na semana passada, o Presidente da República Portuguesa, Jorge Sampaio, inaugurou em Sydney a mais recente obra de Luís Geraldes - um mural com 30 metros de comprimento, no bairro português de Petersham.

Texto de Ricardo Veloso, correspondente do Jornal Expresso na Austrália.Fotografia de Luiz Carvalho

 

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