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Os Professores são Avaliados em Portugal ?

Carlos Fontes

 

 

A demagogia do Governo do Partido Socialista (PS) ultrapassou todos os limites, ao afirmar que os professores em Portugal não são avaliados, nem nunca o foram. O Governo montou uma campanha de propaganda destinada a convencer a população que os professores tem medo de ser avaliados.

A verdade é que não existe nenhum grupo profissional como o dos professores do ensino não superior, que sejam mais vezes avaliado. Uma das particularidades do sistema de avaliação destes professores é justamente a sua frequência e extrema complexidade. O seu principal objectivo tem sido o de controlar totalmente a actividade profissional dos docentes, retirando-lhes toda e qualquer autonomia. No limite pretende-se que os professores sejam transformados em burocratas às ordens do Ministério da Educação. 

O sistema de avaliação que esteve em vigor até Fevereiro de 2008, e que foi também criado pelo PS, exigia um esforço continuo dos docentes para arranjarem e produzirem documentos para a sua avaliação. O novo sistema vai ainda mais longe nesta visão totalitária, ao pretender criar uma estrutura onde todos se andem a vigiar e classificar mutuamente, descurando completamente a questão da melhoria das práticas lectivas.  

Só por total desconhecimento do sistema educativo, pode um primeiro-ministro afirmar que os professores portugueses nunca foram são avaliados e as progressões eram automáticas. A ignorância tem limites.

1. Avaliação na Formação Académica 

A totalidade dos professores das escolas públicas em Portugal possui formação superior, as excepções são infelizmente residuais no sistema, como é o caso dos professores de disciplinas essencialmente práticas. Quantas vezes foram avaliados ao longo da sua vida escolar ?

2. Avaliação na Formação Pedagógica

A totalidade dos professores das escolas públicas, com raríssimas excepções, tem igualmente formação pedagógica especializada, um luxo na União Europeia. Acresce dizer que esta formação foi obtida em instituições do ensino superior ou os professores fizeram-na no passado nas escolas, segundo metodologias consideradas das mais rigorosas e exigentes a nível internacional. Um luxo, repetimo-lo, só possível num país com uma larga percentagem de analfabetos. 

3. Avaliação das Escolas /Avaliação do professores

É sabido que a principal avaliação de qualquer professor está ligada à avaliação das escolas onde trabalha. Se é certo que os resultados das mesmas não podem ser exclusivamente atribuídos aos seus professores, não é menos verdade que eles são os primeiros a serem responsabilizados. Será que as escolas não são avaliadas em Portugal? Os alunos, o pais e as comunidades locais não o fazem ?. Não se publicam "rankings" de escolas a nível nacional ? 

4. Avaliação das Disciplinas / Avaliação dos Professores

As diversas disciplinas ou "matérias" do 2º., 3º. ciclo e ensino secundário, para só citar estes níveis de ensino, são objecto de continuas avaliações. Será que os mesmos não afectam os professores que as leccionam? Será que os exames nacionais que o Ministério da Educação tem suprimido, não tem servido para avaliar os resultados alcançados nas diferentes disciplinas a nível nacional e em cada escola ? Será que estes resultados não etm servido para avaliar os professores que as leccionam em cada escola ?. 

5. Avaliação pelos  Alunos

6. Avaliação pelos Encarregados de Educação.

7. Avaliação pelos Directores de Turma

A lei atribuiu verdadeiros poderes aos Directores de Turma (DT) em cada escola para avaliarem a acção dos professores. Compete-lhes, entre muitas outras funções, identificarem em cada turma os  problemas no processo de ensino-aprendizagem e propor medidas julgadas adequadas para os corrigirem. Qualquer professor ao longo do ano, tem que prestar vezes sem conta testemunhos do seu trabalho aos DT. Será que isto não é também um processo de avaliação do desempenho do professor ? 

8. Avaliação pelos Conselhos de Turma

Num patamar acima do DT, o Conselho de Turma, tem nas escolas públicas vastas funções de acompanhamento e avaliação da acção dos professores em cada Turma. Reúne-se várias vezes durante o ano para analisar e deliberar sobre todos os assuntos da turma. Todos os professores são obrigados a prestar contas da sua actividade a este orgão. Não estamos perante uma outra modalidade de avaliação do desempenho do trabalho dos professores?

9. Avaliação pelos Conselhos Executivos das Escolas

10. Avaliação pelos Departamentos Escolares

Os professores do 2ª., 3º. Ciclo e do Ensino Secundário estão integrados nas Escolas em Departamentos. A lógica é corporativa e visa justamente permitir um maior acompanhamento e avaliação entre os pares da actividade de cada docente. Planeamento das aulas, definição de objectivos, resultados alcançados por cada professor tudo é devidamente analisado. A prática nem sequer é nova foi instituída  na sua forma actual no tempo da Ditadura.  Não será isto outra modalidade de avaliação ?

11. Avaliação pelos Conselhos Pedagógicos das Escolas

Uma das principais funções dos Conselhos Pedagógicos nas escolas, consistem em analisar e aprovar medidas que visam a melhoria da qualidade do ensino, o que envolve a analise dos resultados globais da escola, mas também da acção de Departamento e todos os casos individuais relevantes. Compete-lhe aprovar todas as medidas julgadas necessárias para os atingir.  Não será isto outra modalidade de avaliação do desempenho docente?

12. Avaliação para Progressão na Carreira

Os professores  sempre foram avaliados em Portugal para puderem progredir na carreira. Um dos últimos modelos foi justamente introduzido por Cavaco Silva, quando era 1º. Ministro. Os professores que quisessem passar do 7º. para o 8º. escalão tinham de apresentar um trabalho de carácter científico ou pedagógico fazendo depois a sua defesa pública. 

O Partido Socialista, chefiado por António Guterres, resolveu mudar este modelo em 1998. A partir de então passou a exigir-se que os professores para mudarem de escalão tinham que produzir um relatório de auto-avaliação e apresentar provas de terem feito acções de formação creditadas pelo Ministério da Educação. Este relatório era avaliado por uma comissão que em cada escola era constituída para o efeito. 

Os professores passaram a investir largos milhões de euros em acções de formação, em cursos de pós-graduação, mestrados e doutoramentos para puderem progredir na carreira. 

Em 2007 cerca de 4% dos professores do ensino não superior já haviam adquirido o grau de mestre ou de doutoramento (dados do M.E.). Um valor que tem aumentado todos os anos, o que revela só por si o enorme investimento que estes docentes tem vindo a fazer na sua qualificação. 

A progressão nunca foi automática, pois as escolas eram obrigadas a criarem comissões de avaliação para analisarem e decidirem, com base nos elementos definidos na lei, se os professores reuniam as condições e o mérito julgados necessários para "subirem" de escalão. 

Aquilo que o primeiro-ministro José Sócrates afirma que é o Ministério da Educação certificava cursos que não o mereciam, dando assim falsos créditos, e as escolas não analisavam os relatórios de auto-avaliação. Sob este pretexto falacioso, coloca em causa um sistema que o seu próprio Partido criou e o próprio Ministério da Educação fiscalizava e credibilizava.

13. Avaliações dos Professores pela Inspecção de Educação

Desde pelo menos o  século o século XIX que existe em Portugal uma entidade para fiscalizar o serviço prestado pelos professores e as escolas. Todos os anos são avaliadas escolas e professores sempre que a situação se impõe. 

14. Avaliações pelo Ministério da Educação

15. Avaliações pela Sociedade

 

A Super-Avaliação do Governo do Partido Socialista

O Governo do PS, como se este sistema de avaliação não bastasse, resolveu acrescentar agora mais uma super-avaliação, através da qual julga finalmente poder controlar os professores classificando-os segundo o mérito. 

O novo sistema não visa aperfeiçoar as práticas pedagógicas, mas tão só controlar e classificar.

A sua aplicação passará a exigir uma permanente produção de documentos para a poder concretizar: 

a ) A auto-avaliação dos professores irá consumir grande parte do seu tempo, pois para a realizarem tem que produzir um elevado conjunto de documento para entregarem aos Directores das Escolas e aos Coordenadores dos Departamentos nomeados pelos directores.

b ) A avaliação de cada docente pelos Directores e responsáveis pelos Departamentos irá envolvê-los num tão complexo processo que lhes sobrará pouco tempo para outras funções escolares.

c ) O novo sistema de avaliação pretende retirar aos professores qualquer autonomia nas escolas invadindo as próprias salas de aula. Cada professor terá três aulas assistidas por ano lectivo, independentemente da sua categoria do profissional, tempo de serviço, provas prestadas, etc. Os parâmetros da avaliação das aulas, estabelecidos numa grelha de observação, são totalmente arbitrários e variam de escola para escola. 

O objectivo é por todos a vigiarem-se a si próprios, num modelo inspirado na antiga Ditadura (1926-1974). Em nenhum país do mundo existe um sistema mais complexo, burocrático e rigido.   

O novo sistema promete também envolver as escolas em inúmeros processos judiciais, pois está repleto de arbitrariedades. Cada director de uma escola passará a ter poder para acrescentar sempre novos parâmetros de avaliação. 

O trabalho cooperativo - umas das dimensões essenciais do processo de ensino-aprendizagem - é completamente secundarizado, a actividade docente é atomizado e burocratizada. Desta forma são agravados os principais defeitos do sistema de ensino português, tendo como única vantagem uma ilusória sensação de controlo por parte do Governo e das suas correias de transmissão nas escolas - novos directores.  

Março de 2008

Carlos Fontes

Carlos Fontes

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