Aulas assistidas - O que está em causa ? Carlos Fontes |
O Governo do PS, numa deriva totalitária, resolveu instituir à pressa nas escolas públicas um modelo de avaliação dos professores cujo objectivo não é melhorar as práticas docentes, mas os sancionar de forma arbitraria. Uma das suas múltiplas componentes do seu modelo de avaliação são as chamadas "aulas assistidas". Todos os anos lectivos, cada professor independentemente da sua categoria, seja titular ou não, deverá ter três aulas inspeccionadas por outro professor. Na prática todos se irão vigiar mutuamente. Qual o objectivo deste sistema de avaliação que é único no mundo? Com que critérios serão feitas as avaliações destas aulas? De acordo com o modelo decretado pelo governo, a operacionalização destas observações ficarão ao critério de cada escola. Numas os procedimentos serão uns, noutras outros radicalmente diferentes. O objectivo é atribuir uma classificação de 0 a 10 pontos, tendo em vista a classificação final do professor. Os critérios foram globalmente definidos pelo Ministério da Educação, mas o seu desenvolvimento e concretização ficaram a cargo de cada Escola. Como seria de esperar, em milhares de escolas de Portugal, a imaginação não tem tido limites. Uma escola, como ocorreu em Leiria, resolveu que observação de duas aulas de 90 deviam servir para verificar o "estado de alma" dos professores, isto é, se estão satisfeitos ou insatisfeitos com as políticas educativas, etc. Outras que avançaram na definição das "grelhas de avaliação" centraram os parâmetros da observação ao nível de conhecimentos transmitidos pelos professor, o seu grau de profundidade, rigor científico, etc.. A maioria teve o bom senso de pedir tempo para que os professores pudessem reflectir sobre o que à pressa lhes era pedido. No dia 8 de Março de 2008, fazendo juz à sua competência profissional, mais de 100 mil professores vieram para a rua afirmar que a avaliação do seu desempenho profissional não podia ser tratada desta forma. Se o fizessem estavam dar um mau exemplo ao país e aos seus alunos. O que se pode avaliar numa sala de aula ? A questão está longe de ser pacifica em Portugal ou em qualquer parte do mundo. Ninguém dúvida que existe uma relação entre a forma como os professores dão as suas aulas e os resultados obtidos pelos alunos. No entanto, não é possível atribuir de forma mecânica a mudança de resultados de uma aluno à acção de um professor. Um dos problemas centrais tem sido o de saber como é que as práticas lectivas se reflectem na aprendizagem dos alunos e quais são as mais eficazes, isto é, produzem melhores resultados na aprendizagem. A questão está longe de se reduzir a uma dimensão técnica. Os critérios de observação das aulas, em termos internacionais, incidem em geral sobre um conjunto de dimensões que se tem consideradas eficazes na melhoria do rendimento dos alunos: 1. Direcção e orientação das aulas;
2. Grau de controlo e uso de sanções;
3. Conteúdos e planificação das aulas;
4. Estratégias de comunicação e aprendizagem;
5. Técnicas de motivação;
6. Procedimentos de avaliação.
A questão não é todavia pacífica, em primeiro lugar o conteúdo destas dimensões varia bastante, em segundo lugar, o modo o estilo como o professor os deve aplicar não é consensual. Uma aula de matemática é seguramente diferente de uma aula de filosofia, pois exercitam competências diferentes.
Qual o melhor estilo para dar aulas ?
Os estudos neste domínio apontam, em geral, para dois casos extremos: os professores liberais e os professores formais.
Os primeiros centram as aulas nos alunos, privilegiam o diálogo. O professor coloca perguntas aos alunos, incita-os a participarem, aceita e aclara as suas respostas.
Os segundos dão uma enorme importância à explicação e exposição da matéria, à clareza das instruções, para corrigirem sistematicamente os erros dos alunos. A autoridade do professor está sempre em evidência em todo o processo de ensino-aprendizagem.
Qual é melhor estilo ? A questão não faz sentido. Depende de muitos factores, nomeadamente da própria personalidade do professor. Acontece que a questão do estilo se torna irrelevante se o professor não tiver condições para o aplicar. Um estilo "liberal" pode funciona muito bem com um grupo de alunos, mas ser desastre com outro.
Existem Regras Minímas de Eficácia para dar aulas?
As regras mínimas de eficácia decorrem do bom senso, embora com alguns ajustamentos em função da idade dos alunos:
1. A matéria a ensinar deve ser ajustada à idade, capacidades e tempo disponível. A selecção e ordenação dos conteúdos de aprendizagem é fundamental.
2. Os alunos devem saber o que se estão a aprender, os seus objectivos do que aprendem e a sua finalidade;
3. Os alunos devem ser guiados no seu processo de aprendizagem pelos professores, que através de perguntas verifica o seus grau de compreensão;
4. A aprendizagem deve estimular a progressiva autonomia dos alunos no exercício das competências que estão a adquirir.
Estas tarefas só são possíveis ao longo de um processo de ensino-aprendizagem, no qual os professores vão continuamente alterando métodos, estilos e atitudes para levaram os alunos aos objectivos pretendidos.
Os tecnocratas do Ministério da Educação, em Portugal, dando mostras de não perceberem nada do assunto, querem transformar a prática lectiva num reprodução mecânica de técnicas, sem terem em conta os alunos, idades, contextos educativos, etc.
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Teatro nas Escolas Públicas O novo modelo de avaliação, a ser levado à prática, irá transformar as escolas públicas portuguesas numa sessão continua de peças de teatro, como já alguém referiu. Uma aula não obedece a qualquer guião rígido que os seus actores - alunos e professores - se limitem a seguir. É claro que uma aula implica programação, definição de objectivos e transmissão de conteúdos, mas implica também interacção entre alunos e professor. Nem sempre aquilo que se tinha programado "funciona". Muitas vezes, a exploração dos imprevistos numa aula produzem milagres no processo de ensino-aprendizagem. Neste contexto o que é que o avaliador avalia? O cumprimento do programa ou as capacidades de improvisação do professor? O novo modelo de avaliação, com as multiplicação das aulas assistidas, assenta numa visão mecânica do processo de ensino. Pretende impor nas escolas grelhas únicas para avaliar todos os professores, cortando com a sua autonomia, desvalorizando a sua inteligência e criatividade.
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Carlos Fontes, Março de 2008 |
Carlos Fontes