Museus: os Números Mentem ? 

 

1. As estatísticas sobre museus, divulgadas pelos INE, apresentam desde 1974, uma subida constante no número de visitantes. Nesse ano eram 2,546 milhões, correspondentes a 114 museus. Em 1980 o seu número ascendia a 2,989 milhões. Dez anos depois subia de 6,317 milhões. Em 1994 cifrava-se já em 8,292 milhões de visitantes, sendo 333 o número de museus considerados.

Para um leitor mais atento destas coisas de estatísticas culturais do INE a primeira constatação é que a acepção de "museu" seguida é muito lata, não se identificando facilmente com a noção corrente.

Segundo os critérios de classificação do INE, são considerados como visitantes de "museus", os que frequentam espaços tão diversas como, jardins botânicos, jardins zoológicos, reservas naturais, planetários, lugares ou monumentos arqueológicos, etc.

Para baralhar ainda mais qualquer análise sobre o número de visitantes a "museus", em 1985, houve uma mudança na sua classificação, em consequência da qual só num ano o número de visitantes aumentou mais de 1,3 milhões ...

2. É necessário uma análise mais cuidada destes números para verificar o que se passa na realidade.

Se tomarmos em consideração, apenas os 50 museus, que hoje integram o Instituto Português de Museus, os números mostram outra realidade. Pelo menos nos últimos 20 anos, globalmente, não houve aumento de visitantes.

Em 1980, os 33 museus no âmbito do então IPPC foram frequentados por cerca de 1,088 visitantes. Catorze anos depois, quando Lisboa era Capital da Cultura Europeia, os museus já dependentes do IPM foram frequentados por 1,240 milhões visitantes, apenas mais 168 mil que dois anos antes...

3. A criação do IPM, em 1991, procurou dar a dinâmica que estes não conheciam há muito. Sob a coordenação de Simoneta Luz Afonso, a SEC, iniciou uma típica política fontista nos museus do Estado. Foram feitas algumas obras remodelaram completamente o Museu Soares dos Reis, Machado de Castro e Museu Nacional de Arte Antiga , para além de outras em mais 16 museus em todo o pais.

O alargamento de horários, organização de exposições temporárias, acompanhados por excelentes catálogos e a inventariação dos bens móveis foram algumas das medidas que adquiriram também nesta nova política alguma visibilidade pública. Mas apesar disso, é necessário reconhecê-lo, o número de visitantes, mais uma vez não aumentou na mesma proporção.

4. Alguns museus, como o Museu do Chiado( inaugurado em 1994) e o Museu Nacional do Azulejo, pelo acção dos seus responsáveis directos, adquiriram uma dinamismo sem paralelo com os seus congéneres no IPM.

5. As mudanças políticas, depois de 1995, alterações na trajectória que vinha a ser seguida, visando atrair novos visitantes aos museus. Saída de Simoneta Afonso, em Agosto de 1996, é o traço simbólico da mesma.

Das ideias da nova presidente, Maria Antónia Pinto Matos, nada se conhece. Está ainda numa fase de diálogo e reflexão .

6. No entanto, mais uma vez os números permitem-nos ver algo mais, do que perecia evidente, mas não é o que se passa na realidade.

Desde há pelo menos 20 anos que a situação dos museus pouco tem variado em Portugal. Há os que tem sempre visitantes, tenham ou não exposições, ou mesmo condições de funcionamento, e os que mesmo as tendo, apenas esporadicamente tem visitantes à altura dos seus fundos em obras de arte e investimentos feitos. Estes precisam de exposições e outras iniciativas, como o pão para a boca, se querem ter vistantes acima da fasquia do ridículo.

Neste sentido, podemos dividir pela frequência, os principais museus do país em dois grandes grupos:

a) Os que são valorizados porque se inserem em circuitos turísticos ou excursões escolares, sendo vantagens suplementares terem parques de estacionamento automóveis ou para merendas próximos. O espólio, por importante que seja, não parece ter muita influência na frequência. Mais de 80%, de visitantes dos museus do IPM, pertencem desde sempre a este grupo. À cabeça, surge o museu mais visitado, o dos Coches (Lisboa), seguido do de Conimbriga (Condeixa), e grande distância o do Trajo(Lisboa), José Malhoa (Caldas da Rainha), Aveiro, Grão Vasco (Viseu) e Évora. A ordem desde 1979, praticamente mantém-se inalterada.

b) O grupo dos museus-galerias, constam todos aqueles cujos picos de frequência estão directamente ligados a organização de exposições. Quando estas acabam, os museus voltam à imensa calma que os caracteriza grande parte do ano. Como exemplo, paradigma deste tipo, estão o museu de etnologia e o do teatro, ambos em Lisboa. No entanto, na década de 80, o Museu Nacional de Arte Antiga e o Museu Soares dos Reis no Porto, passaram a fazer parte desta categoria. Já não conseguem, sem exposições atrair mais visitantes, por mais remodelações que sofram.

Em qualquer dos casos, as estatísticas estão aí para mostrar que no campo do património, sem turistas ou alunos das escolas, nem parques de estacionamento ou de merendas, as obras de arte só por si, não atraem mais visitantes aos museus. Ou será que os números mentem ?

Carlos Fontes

1997.6.27



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