Guerras

 

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Monoteísmos: Um Perigo Para a Humanidade ?

1. Pagãos: de perseguidores a perseguidos

Celso, um cidadão romano da segunda metade do século segundo, indignava-se na antiguidade contra os cristãos porque estes eram exclusivistas. Não admitiam outros deuses e crenças, mas apenas um único Deus, o seu. Esta era a razão porque os perseguiam e matavam.

Os romanos que seguiam as ideias de Celso acabaram por perder, o monoteísmo  cristão acabou por sair vitorioso.

Os cristãos de perseguidos, no século IV passaram a perseguidores. Se milhares de deles foram mortos pelos pagãos romanos, muitos mais pagãos irão ser mortos às mãos dos cristãos ao longo de séculos até à total cristianização do Norte de África e depois da Europa. 

Não foram apenas os pagãos a sofrerem a ira dos cristãos em nome de um Deus único, mas os próprios cristãos (hereges), ou seja os que por um motivo ou outro se desviaram das interpretações "oficiais" dos textos bíblicos.

2. A Minoria Judaica

Os judeus, um dos primeiros povo a defenderem a crença num Deus único, devido ao facto de estarem em minoria, desde o século VIII a.C., raramente tiveram hipóteses de exterminar os seguidores de outras religiões.

Estas comunidades minoritárias tiveram que contentarem-se em viver entre povos idolatras, como os cristãos. Estes durante séculos acusaram-nos de serem "descendentes" de um traidor - Judas -, o "grande" responsável pela morte de Cristo. 

A única consolação que encontraram foi refugiarem-se na presunção de serem um povo eleito, aquele que num mundo de idolatras tem por missão divina preservar os rituais e as crenças num Deus único, devendo evitar misturar-se com os povos (impuros), isto é, todos os outros. Os que o faziam eram perseguidos e mortos.

3. Muçulmanos em Guerra

Maomé, emerge no século VII como o último profeta, aquele que veio corrigir os desvios dos judeus, dos cristãos e demais idolatras. A expansão do islamismo foi de início o resultado de uma guerra, marcada por enormes matanças pela Ásia, Norte de Africa e Europa (Península Ibérica ). A escolha era reduzida para os que sobreviviam: aderiam à nova religião, fugiam ou viviam sobre uma permanente exclusão social, pagando pesados tributos.   

No século XV, com o Império Otomano passam de novo ao ataque, expandindo-se pela Europa Oriental, mas sobretudo pela Ásia. Cada avança foi acompanhado por enormes matanças.

4. Cristãos ao Ataque

A reconquista cristã da Península Ibérica, da qual irá surgir Portugal (século XII), foi uma guerra de séculos. Entre os séculos VIII e 1492 os cristãos expulsam e matam os invasores muçulmanos. No final a sua religião, como o judaísmo, será banida. A Inquisição (século XV- XIX) se encarregará de perseguir os que ficarem.

Ainda durante o século XI, os cristãos irão de novo tentar reconquistar a terra onde Cristo nasceu (Palestina). As cruzadas (1096 a 1312) convertem-se rapidamente num guerra onde nada é poupado, incluindo o Império Bizantino (cristão). 

Se na Europa, a emergência do Império Otomano parece não ter quem lhe faça frente, em África e na Ásia, os portugueses prosseguiram o espírito de cruzada (evangelização? Comércio ? ) matando o "turco" onde o encontravam, difundindo desta forma o cristianismo. Só serão detidos no século XVII, não pelos turcos, mas por outros cristãos: holandeses, ingleses e franceses. 

A preocupação dos novos guerreiros europeus não é espalhar o cristianismo, mas apoderar-se simplesmente das riquezas que estavam na posse dos portugueses. Para isso, não hesitam em aliar-se aos muçulmanos para os combater. A guerra deixa de ter uma justificação religiosa, como acontecia com os portugueses, para ser apenas uma acção comercial conduzida por grandes companhias capitalistas. 

É em nome do capital, e não de Deus, que as potências europeias como a Inglaterra, obrigam a India, China ou o Japão a abrir-lhes as portas. Pouco lhes interessa a questão religiosa, o que conta é os negócios.      

5. Genocídios 

A descoberta da América, em 1492, por Cristovão Colombo (Português ? Italiano ?) , marca o regresso aos primitivos tempos dos cristãos. No novo continente não se tratou combater os muçulmanos, nem sequer de evangelizar os indígenas locais, mas de destruir as marcas da cultura e da religião dos povos locais exterminando todos aqueles que se mostravam inassimiláveis. Entre os séculos XVI e XVIII, os espanhóis irão destruir de forma sistemática civilizações milenares, como os Incas, Azetecas e os Maias. O Deus único irá triunfar sobre os escombros das suas antigas cidades e milhões de mortos.   

A matança esporádica de judeus foi uma prática corrente na Europa desde a Idade Média. Aliados dos poderosos, os judeus, provocavam contudo, mais por este facto   a ira das populações, do que pela religião que possuíam. A história anda muito mal contada sobre neste domínio. No século XIX e XX, algumas das potências mais desenvolvidas Europa, onde a Inteligência brilhava, resolvem fazer aquilo que foi feito na América - exterminar um povo que pela sua religião se mostrava inassimilável. O holocausto tornou-se numa industria na Alemanha, Hungria, Austria e outros países do leste da Europa. Foi uma obra de reputados cientistas e engenheiros, não de  ignorantes. 

6. O Regresso à Barbárie    

O Deus único domina hoje nas religiões do mundo. As matanças foram enormes até chegarmos aqui. O problema é que cada religião monoteísta tem o seu Deus único. O exclusivismo é total.

O Deus único dos cristãos, não se confunde com os Deus único dos muçulmanos, nem com o Deus único dos minoritários judeus. Abdicar deste princípio é abrir as portas ao fim das grandes religiões  monoteístas, nomeadamente das suas estruturas (instituições, agentes), das suas práticas, tradições, culturas. Cada religião tem as suas áreas de domínio e influência. O poder de cada religião está sempre em jogo. Acabar com os que as divide, pode ser muito importante para a paz, mas a longo prazo ditará o fim das religiões. Este é um ponto que nenhuma religião abdica, sob pena de desaparecer. Não admira que a guerra entre as religiões prossiga, e entretanto a barbárie continua.

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Carlos Fontes

 

 

 

 

 

 

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