Carlos Fontes

.

.

Os Medos que Afligem a

Europa no Início do IIIº. Milénio

 

.

A principal consequência da globalização não foi a difusão dos mesmos produtos em todo o mundo, mas a brutalidade dos confrontos que emergem da circulação da informação.
    A injustiça torna-se mais odiosa. A espera  transforma-se em desespero. O que surgia como sublime torna-se banal.

   
O homem globalizado tende a oscilar entre dois extremos: o apego a crenças ancestrais e a indiferença.

   O projecto racional da modernidade foi abandonado. A Pós-Modernidade mergulhou no relativismo.

 

 

.

As Intenções e a Realidade

O promessa do mundialismo é o velho sonho de todos os cosmopolitas: Realizar a unidade política do mundo, fazendo dele uma única comunidade humana.  

Ninguém imaginaria é que este sonho se tornaria numa exigência económica para a sobrevivência das grandes potências do mundo. O crescimento das suas empresas e o aumento do consumo dos seus habitantes, exigiu a expansão dos seus mercados e das áreas de predação dos recursos existentes no planeta.

Para isso se tornasse possível, passaram a reclamar em nome de uma prosperidade futura, a abolição dos controlos dos movimentos de capitais, a liberalização dos serviços financeiros transfronteiriços, a eliminação das restrições que limitavam o acesso das empresas estrangeiras aos mercados nacionais.

Os ricos esperavam maior prosperidade e tem-na tido. Aos pobres foi-lhes prometido o paraíso, mas só depois duma fase de tormenta. O que tem tido, é apenas a miséria. A melhoria das condições de vida é cada vez mais uma miragem para a maior parte da população mundial.

 

   

Não ir à Escola

           Não poder ir à Escola

Milhões de alunos em todo o mundo não vão à escola, porque não lhes apetece. No mesmo planeta, em 2003, mais de 121 milhões de crianças não foram à escola porque não puderam. As razões porque não vão à escola são muitas: trabalham, não existem escolas onde residem, foram discriminadas no acesso ao ensino, etc.

As meninas continuam a ser as mais descriminadas: 65 milhões em todo o mundo. Na mártir região da África subsariana em 1990 eram 20 milhões em 1990, mas em 2002 ultrapassavam os 24 milhões. A esta negra lista é encabeçada pelo sul e o leste da Ásia e Pacífico. Quatro em cada cinco meninas não escolarizadas vivem nestas regiões do planeta. Dados: Unicef, 2003

Vistos à distância os terráqueos podem ser divididos em dois grandes grupos:

a) os que diariamente lutam por uma pobre ração alimentar que lhes permitam sobreviver, e atribuem este facto ao seu Destino, à corrupção dos seus dirigentes, às antigas potências  colonizadoras ou às actuais potências capitalistas; 

b) os que acreditam que todos os homens são profundamente individualistas, e atribuem este facto ao trabalho doutrinal de  filósofos como Descartes, Kant, Nietzsche e outros, mas também aos valores da sociedade burguesa e consumista.     

Os primeiros entraram na Era do Desespero, e parece que só lhes resta emigrar.

Os segundos preparam-se para passar da Era do Individualismo para a Era do Narcisismo. A clonagem humana irá em breve permitir que se "fotocopiem" para satisfação dos seus EUs. 

C F

.

Globalização, Direitos Humanos e Imigração

.

1. Os Que Chegam

..

A globalização acentuou de forma dramática a percepção das desigualdades entre os povos. 

 

A vida para dois terços da Humanidade tornou-se um sofrimento e privação quotidiana. Milhões morrem à fome, sabendo que noutra parte do mundo outros morrem por obesidade, atolados no consumismo. Olham à sua volta e constam que nada tem do que a outros sobra. Muitos não suportando tanta privação, todos os anos partem das suas terras em busca do seu quinhão na Europa, EUA ou num outro qualquer mítico paraíso. Estão dispostos a tudo, menos a continuarem a suportar a privação. É uma luta de vida ou de morte.

 

Os que conseguem chegar ao "paraíso", o que encontram ( se encontrarem) é trabalho escravo, a luta infernal pela sobrevivência dia após dia. A esmagadora maioria aceita trabalhar e viver à margem da lei e em condições infra-humanas para os padrões locais. 

 

Não tardam em se  aperceberem que não passam de mão-de-obra barata, sem direitos de espécie nenhuma. Sobre estes pobres imigrantes acaba por recair a acusação de estarem a destruir  direitos dos trabalhadores que duramente os conquistaram nos países que agora os acolhem. 

 

Não tardam também em tomarem consciência que neste processo estão igualmente a serem usados pelos Estados. Quanto mais entraves burocráticos lhes impõe à legalização, mais os forçam a viverem na clandestinidade ao sabor das mafias e maior é a pressão sobre os restantes trabalhadores. Na verdade, quanto maior for o contigente de clandestinos no mercado de trabalho, maior será pressão sobre os que estão legalizados para aceitarem uma generalizada precarização das relações laborais, assim como maiores jornadas de trabalho e uma redução nos salários. 

2. Os Que Perdem

A globalização ao abrir as fronteiras ao comércio mundial, desenvolveu a competição entre empresas e trabalhadores de todo o mundo. Nesta competição global, a única forma de sobrevivência possível é produzir mais e mais barato. 

Nos países onde se concentram dois terços da Humanidade, milhões de crianças são usadas nesta competição global. A escravatura tornou-se uma prática corrente. É certo que milhões de  pessoas nunca conheceram outra. 

Acontece que as migalhas para dois terços da Humanidade, representam para o outro terço o desemprego, o fim das estruturas de segurança social, a quebra dos laços de solidariedade, etc. Estes são os efeitos perversos da competição à escala global.  

3. Os Novos Predadores

 

O mundo assiste hoje à globalização da especulação financeira. Os novos predadores aniquilam sectores económicos inteiros de países em operações bolsistas, realizadas alguns num qualquer ponto. O capital não tem pátria, nem limites para a sua acumulação. Os meios usados perderam toda a conotação moral, estão convertidos em simples "operações" financeiras.

Os mundo assiste hoje à expansão da consumismo numa lógica predadora de recursos. Um terço da Humanidade consome de forma impulsiva. Pouco lhe interessa quem fabricou os produtos, as condições em que os fez e a que custo. O que verdadeiramente conta é que os mesmos lhes agradem e os possa adquirir. 

Face a este panorama, os direitos humanos se são a única referência consistente, são também uma referência vazia de sentido para a maior parte da Humanidade, para a qual a questão prioritária é a da sobrevivência física dia após dia.   

Carlos Fontes     

 

 

Continuação

Para nos contactar:
carlos.fontes@sapo.pt