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História da Formação Profissional e da Educação em Portugal

Carlos Fontes

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Idade Contemporânea - (Séc.XIX)

Ensino Industrial - Institutos Industriais de Lisboa e Porto

 

Na década de cinquenta, com Fontes Pereira de Melo á frente da Pasta das Obras Públicas, Comercio e Industria o ensino industrial entra numa nova fase, onde as obras publicas se tornam no pólo central do desenvolvimento do país.

As obras publicas, á cabeça das quais estava todo o sistema de comunicações do país, necessitava  mais do que nunca de tecnicos e dirigentes para a realizar.

A Academia Politécnica do Porto prosseguia um importante obra na formação de engenheiros, mas em numero ainda muito diminuto. A Escola Politécnica de Lisboa estava dependente da Escola Naval e da Escola do Exercito, das quais era na pratica uma escola preparatória. As obras que são postas em marcha por este ministério não se compadecem este ensino técnico. Para o ultrapassar as suas limitações são criados Lisboa e Porto, duas importantes escolas, com finalidades idênticas: A Escola Industrial do Porto e o Instituto Industrial de Lisboa. Orientavam-se para instrução geral de operários habilitados, formação de condutores de obras publicas, de máquinas, de minas, mestres de quimica ,de construtores de instrumentos de precisão, de técnicos para os correios, telegrafos, faroleiros, em suma, actividades requeridas pelo desenvolvimento industrial do país. A formação prática norteava este ensino.

1. Instituto Industrial do Porto. No mesmo ano que a Associação Industrial Portuense criava uma Escola Industrial, Fontes Pereira de Melo , estabelecia também na cidade do Porto, a primeira Escola Industrial do Estado[1], em 1864 designada por Instituto Industrial do Porto[2], de acordo como o seu homólogo em Lisboa.

Depois de várias andanças foi instalado numa parte do edificio do colégio dos orfãos ( Passeio da Graça ), onde já estava a Academia Politécnica, o qual passou a ser então conhecido por por "Paços dos Estudos".

    O ensino nesta escola só principiou em 1854, e estava dividido em três niveis, o elementar , o Complementar e o Especial, tendo por base um tronco comum de matérias.

    O Ensino Elementar era conhecimentos comuns a todos as artes e oficios. Era constituido por cadeiras como a Aritmética, algebra, Geometria, Desenho Linear e Desenho Ornato. Servia para ministrar uma instrução geral dos operários, e equivalia também a um curso preparatório para os outros niveis de ensino.

    O Ensino Complementar ( ? Secundário) tinha apenas tres cadeiras, a de Geometria Descritiva Aplicada ás Artes, Noções Elementares de Quimica e Fisica e Desenho de Modelos e Maquinas ( Primeira Parte ); Com uma ou outra cadeira mais, formava-se um mestre de obras publicas, de artes mecânicas ou de artes quimicas, etc.

    O Ensino Especial ( ?) tinha um conjunto de disciplinas mais especificas, como mecanica Industrial, Quimica Aplicada, Economia e Legislação Industrial e Desenho de Modelos e Maquinas ( segunda parte ). De acordo com cada especialidade, assim se seguia uma ou outra das cadeiras, correspondendo estes cursos aos condutores de obras publicas, de minas, directores de estabelecimentos fabris, e depois de oficiais (? ) de correios, telegrafos, faroleiros, etc.

A semelhança do Instituto Industrial de Lisboa, esta Escola admitia dois tipos de alunos, os ordinários e os voluntários, frequentando estes ultimos as cadeiras segundo as suas preferências.

Apesar da vocação tecnica destes Institutos, as preferências dos alunos estavam longe de se orientarem nesse sentido. Muito pelo contrário, os cursos de carácter geral, mas que permitiam maiores hipóteses no mercado de trabalho eram os mais preferidos; Em 1873, o Jornal "Correspondência de Portugal", a 13 de Maio escrevia  o seguinte  sobre este Instituto Industrial do Porto: "Os alunos ordinários são 285; os voluntários 248; os registados 325; ao todo 958. As cadeiras mais frequentadas são as de principios de matemática puras, desenho, geometria descritiva, estudo de gesso e modelação. A de linguas francesa e inglesa tem 155 alunos. É de sentir que somente dois individuos estudem ali a Mecanica Industrial e aplicação ás máquinas, assim como somente 12 os que seguem o curso de Quimica Geral e Aplicada".

A situação não se havia alterado dez anos depois. Em 1883 neste Instituto eram ministrados nove cursos[3], frequentados por um total de 494 alunos. Destes 232 cursavam a Instrução Geral Para Operários Habilitados, 127 o curso de condutor de Obras Publicas, 35 o de Telegrafistas, 35 o de Mestre de Obras, ?  Condutor de Maquinas e Fogueiro. Entre as dez cadeiras então existentes[4], as mais frequentadas eram a 1. ( Aritmética, Algebra e Geometria), a 2. ( Desenho Linear ),a 8. (Desenho de Ornato) e a 10. (Lingua francesa e Inglesa), tanto por os alunos ordinários como pelos voluntários. Este ensino era um importante meio de promoção social para inúmeros operários que não tinha tido outra possibilidade de estudar. Neste ano, dos 494 alunos, apenas 141 não declararam no acto da matricula possuírem uma profissão. 62 eram Carpinteiros, 56 canteiros, 53 empregados, 21 serralheiros, 20 pintores,15 marceneiros, 13 telegrafistas, 11 militares, 11 ourives, 11 pedreiros, 10 trolhas, 7 professores primários,4 entalhadores, 3 tipógrafos, 3 fotografos, 3 estocadores, 3 escultores, 3 comerciantes, 3 chapeleiros, 3 relojoeiros, 2 tintureiros, 2 torneiros, etc. [5].

Os candidatos a estes cursos, tinham que ter um mínimo de 12 anos de idade, saber ler e escrever e possuírem conhecimento das quatro operações elementares da aritmética. Um exame de feito por um juri do Instituto efectuava a selecção final dos candidatos.

  Em 1886, nova remodelação e o Instituto passa a denominar-se Instituto Industrial e Comercial do Porto, tendo agora também o ensino comercial.

Na reforma de 1891, da autoria de Bernardino Machado,  procurava-se  reorganizar o ensino e especializar a cada um dos Institutos. Foram criadas duas Secções, a industrial e a Comercial. Neste capitulo apenas trataremos das reformas referentes á primeira Secção. Nesta são abolidos os cursos industriais elementares, os cursos preparatórios aos Institutos, os cursos especiais para Directores Fabris, Correios e Telegrafos; O Ensino Industrial passa a ser de carácter mais pratico e fica dividido então em dois ramos, o  "Ramo da Ciência Industrial" e o "Ramo de Arte Industrial". No Porto no Ramo Industrial passava a ministrar-se os Cursos de Construção e Condução de Máquinas ( 4 anos),o Curso de Quimica Industrial (4 anos), o Curso de Construção de Aparelhos de Quimica e o Curso de Tecnologia ou Ciência Industrial Geral ( 3 anos). A grande inovação pedagógica desta reforma fica apenas no Porto, no ramo da "Arte Industrial" são criados os Cursos de Desenhador Industrial, de Pintura Decorativa e o Escultura Decorativa.

Na remodelação de 1896 [6] volta-se á situação anterior a 1891, com a criação de um curso preparatório para admissão aos cursos médios e superiores dos institutos.

2. O Instituto industrial de Lisboa, criada em 1852 foi desde logo instalado num velho edificio , junto á Rua da Boa Vista, em condições tais que sempre lhe limitaram a sua actividade. Seguia os mesmos objectivos da Escola Industrial do Porto, embora pontualmente tivessem algumas diferenças em termos de cursos.

Apesar de ser inaugurada em 1852, apenas a partir de 1854, passou a ministrar cursos regulares de nível elementar e médio, registando desde logo uma frequência muito elevada de alunos, cerca de 500; Passados poucos anos de funcionamento, em 1859, era já aprovado o novo regulamento provisório do Instituto , e entre outras medidas de maior alcance, destacava-se a oficialização de uma oficina de instrumentos de precisão ,que funcionaria em anexa a este estabelecimento, e onde não apenas se procedia ao seu fabrico, como á sua reparação, revertendo as verbas apuradas para o Estado.

Em 1864 o ensino foi amplamente reformado, dirigindo-se agora a sua formação para a qualificação de directores de Fabricas e oficinas industriais, mestres, contramestres e condutores dos diferentes trabalhos, como obras publicas, minas e maquinas, para a instrução de fogueiros, telegrafistas, mestres de obras, faroleiros, mestres de quimica, tintureiros e construtores de instrumentos de precisão. Os cursos de mestres de quimica, mestres de obras eram denominados de condutores[7].

    O numero de cadeiras eram já de nove, sendo os seus conteúdos muito valorizados.

    Pela reforma de 1869 será transformado no Instituto Industrial e Comercial de Lisboa,dado que passou a ter cursos comerciais, sendo suprimido o curso de condutores de minas, que se manteve apenas no Porto até 1879, quando de novo voltou a ser ministrado em Lisboa. Esta Reforma traduziu-se em importantes cortes orçamentais que levaram á suspensão de professores auxiliares permanentes, redução das verbas dos museus tecnológicos e laboratórios de quimica e fisica deste Instituto, e no incremento da exploração da oficina de instrumentos de precisão, pelas receitas que gerava.

Em 1886, Emidio Navarro decreta em 30 de Dezembro que o ensino do comércio preparatório seja ministrado neste instituto, ao contrário do que até ai vinha sendo feito, dado que estava incumbido ao Liceu Nacional de Lisboa. Neste ano são criados igualmente cursos  correios, telegrafos, entre outros, e um curso superior de comercio,  o que constituiu uma importante medida no fomento deste ensino.

Em 1891 [8], são suprimidos os cursos industriais elementares, muito procurados pela sua formação em desenho, e os cursos especiais como o de Correios e Telegrafos, assim como os Cursos Preparatórios aos Institutos. Nos dois ramos em que o ensino nos Institutos é dividido, Lisboa especializa-se na " Ciência Industrial", sendo estabelecidos os seguintes cursos: Curso de Construção e Condução de Maquinas ( 4 anos), Curso de Quimica Industrial ( 4 Anos),Curso de Construções Civis (3 anos), Curso Construções Civis e de Obras Publicas ( 4 anos), Curso de Metalurgia e de Arte de Minas (4 anos), Curso de Física Industrial ( 4 anos), Curso de Telegrafista ( 3 anos), Curso de Construção de Instrumentos de Física, Curso de Tecnologia ou Ciência Industrial Geral( 3 anos).

O conjunto destes cursos , constituía o Curso Superior Industrial. "A circunstancia do curso Superior Industrial ser exactamente constituído pelo somatório das cadeiras dos cursos de condutor, a impropriedade já então reconhecida desta designação , e as reclamações apresentadas pelos respectivos  diplomados , deram origem a que, numa nova organização dos cursos promulgada em 1898, desaparece-se essa designação de "condutor" sem todavia fosse substituída por qualquer outra. O curso superior também não correspondia qualquer designação profissional", esta situação só será alterada em 1924.

O tirocinio na Secção Industrial era de dois anos de aprendizagem na oficina de máquinas e caldeiras do Arsenal da Marinha, ou em qualquer fábrica particular, ou ainda a frequência de dois anos das oficinas dos Institutos de Lisboa e Porto.

As modificações na Secção Comercial já foram tratadas noutro capitulo.

Esta Reforma foi profundamente contestada, pois entre outras coisas acentuava nos Instituto o caracter pratico deste ensino exigindo-se a constante realização de trabalhos práticos de aplicação dos conhecimentos teóricos.

    A reforma de 1898 [9] redistribuiu as cadeiras de 1891, e cria com elas no Ramo Industrial o Cursos de Artes de Quimica,  o Curso de Electromecanica, o Curso de Máquinas, o Curso de Construção Civil e Obras Publicas, o Curso de Minas e o Curso de Telegrafos, sendo no entanto suprimidas diversas cadeiras. Esta Reforma consolidava uma velha ideia, ao estabelecer no Instituto um Curso Superior Industrial, constituido pelo conjunto das várias cadeiras.

    Em 1903 fez-se uma nova reforma  dos Institutos, mantendo-se o Curso Superior Industrial, passando os seus diplomados a serem denominados "engenheiros industriais". Os restantes cursos eram os seguintes: Curso de Construção Civil e Obras Publicas, Curso de Minas, curso de Electrotecnia, Curso de Máquinas, Curso de Artes Quimicas.

    Em 1905  [10] o ministro João de Alarcão, introduziu alterações nos institutos, fixando a duração dos cursos superiores industriais em 6 anos, e os de comercio em 5 anos.      Em 1911, pela lei de 23 de Maio, Brito Camacho irá dividir o Instituto Industrial de Lisboa, em dois estabelecimentos, o Instituto Superior Técnico e o Instituto Superior de Comercio.

 3. As exigências para admissão aos cursos dos Institutos até 1891 (?), não ultrapassavam o saber ler e escrever, para além do conhecimento das três operações básicas da Aritmética, e uma idade não inferior a doze anos.

A preparação para os Institutos Industriais e Comerciais vinha sendo feita pelos próprios Institutos, que assim se viam a braços com este ensino preparatório descurando a formação especifica nos diferentes cursos. Esta situação foi alterada em 1892, na sequencia de um decreto de Oliveira Martins e do Visconde de Chanceleiros, datado de 6 de Maio,  foi determinado que as escolas primárias municipais passassem para o Estado, e que nas mesmas pudessem ser realizados  cursos primários  complementares,  que seriam equivalentes aos preparatórios aos institutos . Neste ano ministro Pedro Victor da Costa Sequeira fazia depender do MOPCI, a antiga Escola Primária Superior Rodrigues Sampaio que havia pertencido á Camara Municipal de Lisboa, transformando-a numa Escola de Ensino Preparatório aos Institutos [11], mas onde depois Bernardino Machado  veio a estabelecer cursos industriais. Os preparaórios desta Escola tinham a duração de tres anos.

    Em 1893 já se exigia o curso complementar das escolas Industriais, ou o curso complementar das escolas primárias complementares e a lingua francesa, ou ainda o Curso do 1. grau das escolas Normais, ou, a Lingua Francesa e 8 disciplinas adequadas dos Liceus[12].

    Em 1903 para a admissão aos Institutos exigia-se o 5. Ano Liceal, o Curso das Escolas Preparatórias ( 3 anos), ou um Curso Complementar Industrial (?).

    Nascia assim um grau de ensino intermédio ao ensino dos Institutos, situação que se impunha desde a criação da rede de Escolas Industriais em 1884, e que era exigida também pela complexidade crescente das técnicas e tecnologias do tempo.   

Em construção !

  Carlos Fontes

Navegando na Educação

Notas:

1] Decreto de 30 de Dezembro de 1852

[2] Ver L Institute Industriel du Porto --Histoire L Organization , Enseignement. Publicado na Typografia Lusirtana de Bellmonte.1878.

3] Curso de instrução Geral de Operários; Curso de Director de Fabricas e Oficinas e Contramestre ; Curso de condutor de Obras Publicas; Curso de Condutor de Minas; Curso de Condutor de Máquinas e Fogueiro; Curso de Telegrafista; Curso de Mestre de Obras; Curso de Faroleiro; Curso de Mestre Quimico e Tintureiro.

4] 1.Aritmética, Algebra e Geometria, Trigonometria -Topografia e Elementos de Plantas; 2.Desenho Linear--Geometria Descritiva Aplicada á industria -Stereotomia --Desenho de Modelos e Máquinas, Topografico e Arquitectónico; 3. Fisica e suas Aplicações ás Artes -Telegrafia Electrica --Faróis; 4. Principios Gerais da Quimica --Quimica Aplicada ás Artes -Tinturaria e Estamparia; 5.Principios Gerais de Mecanica Industrial --Aplicações ás Construções de máquinas , especialmente ás de vapor--Mecanica Aplicada ás Construções Civis; 6.Construções Civis --Elementos de Tecnologia Geral; 7. Mineralogia , Geologia e Docimasia na parte que diz respeito á análise e ensaios dos minerais úteis --artes de minas; 8. Desenho de Ornato --Desenho pelo Natural -- modelação; 9 Contabilidade e Principios de Economia Industrial --Noções de Direito Comercial e Administrativo e Estatistica; 10. Lingua Francesa e Inglesa.

[5] Portugal. Antigo e Moderno. Augusto S.Pinho Leal.Vol.X,pag.138 (?)

[6] Decreto de 23 de Abril de 1896

7] A denominação de "condutores" que tanta polémica causará, surgiu em 1853 por influencia francesa, onde eram assim designados os condutores de trabalhos publicos de máquinas que revelassem um sólido conhecimento do seu oficio. Em 1864 nos cargos publicos do MOP surgem os lugares de condutores, para os quais se passou a exigir uma carta de aprovação num dos cursos das escolas dese ministério.

8]Decreto de 8 de Outubro de 1891, ver Organização do Ensino Industrial e Comercial. Aprovado por Decreto de 8 de Outubro de 1891. Lisboa. Imprensa Nacional

[9] Decretode  30 de Junho de 1898

[10] Decreto de 3 de Novembro de 1905

[11]Decreto de 10 de Setembro de 1892

[12] Decreto de 5 de Setembro de 1893, ver. Institutos Industriais e Comerciais. Guia do Estudante que Pretende Matricular-se nos Institutos Industriais e comerciais. Companhia Geral. Tipografia Editora.Lisboa.1894.